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Da Natal-RN que coube em minha mala, no fim das melhores férias da vida, trouxe alguns produtos maravilhosos da terra. Cada vez que abro a dispensa e desfruto de um caju em calda ou de um doce cremoso de mangaba é um retorno ao meu Nordeste querido, uma saudade que a memória gustativa ajuda a matar. Vou comendo tudo com muita parcimônia, um cuidado pra que não acabe logo – como aconteceu rapidamente com as castanhas de caju envoltas de açúcar e pimenta ou com o punhado de cajás in natura que contrabandeei na mala de mão dentro da boa e velha tupperware. O licor fino de tamarindo ainda rende – por moderação, assim como a rapadura de castanha de caju – por intolerância adulta a açúcar em excesso. Hoje foi dia de abrir o doce de caju e o pacote de castanha torrada. Geralmente uso este ingrediente em receitas salgadas como vatapá e curries indianos, mas dessa vez realizei uma sobremesa tão boa, mas tão boa que vai entrar no cardápio do natal esse ano, acompanhada de uma raspadinha de caju bem adstringente.
Pensei nessa receita para participar de mais um jogo culinário entre blogueiras francófonas cujo tema do mês foi « oleaginosas de outono ». Sabia que teríamos muitas receitas com avelã, amêndoa, castanha e pistache que são as « fruits à coque » da época no hemisfério norte. Quis dar destaque à castanha de caju por ser nativa e por estarmos na estação de caju aqui no sul do planeta. Aliás, dá caju de junho a janeiro no nosso Brasil, todas as estações, menos o outono. A receptividade da receita foi ótima e descobri que nossa « noix de cajou » tem muitos fãs na França.
O que eu propus foi uma receita fusão, uma apropriação de um clássico de confeitaria francesa, adaptado a ingredientes tupiniquins derivados do cajueiro. Como base, consultei o livro de confeitaria Pâtisserie de Christophe Felder (páginas 708-713). Uma frangipane é um creme de farinha de amêndoas usado como recheio de quitutes como a torta galette des rois consumida no Dia de Reis. Na versão brazuca, usei farinha de castanha de caju para substituir a farinha de amêndoas. O rum da receita original cedeu espaço a uma boa pinga de caju. Reduzi a quantidade de açúcar de 80 para 60 gramas, mas acho que o ponto ideal para mim ainda seria 50 gramas. Quanto à pâte sablée de Felder, a famosa massa podre, também sofreu leves modificações. A massa que Carolina amassou perdeu as raspas de laranja e ganhou raspas de amburana e parte da manteiga foi trocada por banha de porco.
A receita rendeu duas tortinhas de 10 cm e mais uma miudinha em forma de empada. Também vale fazer uma torta maior, forma de 25-30 cm, e servir fatias aos convivas.
Ingredientes para a massa podre (210 gramas)
- 100 g de farinha de trigo
- 1 pitada de fermento químico em pó
- 50 g de açúcar refinado
- 1 amburana ralada
- 30 g de manteiga
- 20 g de banha de porco
- 1 gema
Preparo da massa
Em uma tigela, misture a farinha, o açúcar, o fermento e a amburana ralada. Com as pontas dos dedos comece a incorporar as gorduras. Esfregue essa farofa entre as mãos para produzir uma textura de areia. Abra um buraco no centro da farofa e acrescente a gema. Incorpore tudo sem trabalhar muito a massa. Se necessário para dar liga, acrescente 1 colher de sopa de água gelada. Embale em filme plástico e deixe repousar na geladeira por 1 hora.
Com o auxílio de um rolo, abra a massa numa espessura de 4 mm e forre fundo e laterais de duas formas redondas de 10 cm. Com a sobrinha da massa eu fiz uma versão mini, em forminha de empada, espessura de 2 mm.
Ingredientes da frangipane de castanha de caju
- 80 g de manteiga mole (temperatura ambiente)
- 1 ovo
- 60 g de açúcar mascavo
- 1 colher de sobremesa de pinga de caju (ou cachaça pura)
- 80 g de farinha de castanha de caju
Preparação do recheio
Com um batedor de claras trabalhe energicamente a manteiga para amolecê-la. Misture o açúcar e em seguida o ovo, sempre batendo. Essa etapa também pode ser realizada com um batedor elétrico (60 segundos, se muito!). Em seguida, incorpore delicadamente o álcool e a farinha de castanha até formar uma massa homogênea. Pronto! Um recheio delicioso pronto em 5 minutos.
Montagem da torta e partiu forno!
- cubos de doce de caju (produto do cozimento do caju com açúcar e pedacinhos que castanha triturada: gos-to-so!)
- frutas maduras ou congeladas
- açúcar dourado forneável
Recheie as massas de torta com a frangipane. Distribua pedaços de cajuada e pressione-os levemente para afundarem um pouco, mas ainda permanecerem à vista. O resultado é muito interessante porque esse doce acrescenta à receita uma outra textura, aquela de goiabada, e dinamiza o sabor por conta da acidez do caju. Optei por esse produto do caju na apropriação da receita para me manter coerente com o que propus, mas as sugestões do livro de confeitaria de monsieur Felder são ou um pedaço de fruta bem madura e adocicada (ex: pêra) ou uma fruta vermelha congelada como as cerejas do tipo griotte. Espalhe pedacinhos de açúcar dourado sobre a massa crua e leve ao forno pré-aquecido a 180 C. As tartelettes, por serem menores e mais baixas, cozinham mais ligeiro: 15 minutos. Já as tortas maiores, aqui com 10 cm de diâmetro e mais altas, ficaram no forno por 22 minutos. A dica é conferir se a superfície está dourada e firme.
E copiando minha blogueirinha de viagens favorita, vou aproveitar esse post para propagandear que o Rio Grande do Norte é um destino turístico sensacional. Além das praias e dunas, dos restaurantes de qualidade, das tapiocas e das frutas, da água de côco abundante, dos esportes nada nutella mega divertidos (esquibunda, aerobunda e kamikasi), Natal e região têm um povo arretado muito acolhedor. É uma amizade a cada quadra, uma empatia nata, um carinho na alma mesmo: é uma experiência ímpar. E foi por ali, no município de Parnamirim (praia de Pirangi do Norte), vizinho à capital do Estado, que reza a lenda um moço de nome Luiz cuidou de um pé de caju que data de 1888. Esse cajueiro, fruto de uma anomalia genética, ao invés de crescer para cima cresce para os lados. Seus galhos pesados acabam se curvando em direção ao solo e, ao tocá-lo, a ele se conectam através de novas raízes, formando um organismo vivo gigante, uma floresta de uma árvore só, o dito maior cajueiro do mundo com 8500 m² de superfície e uma beleza imensurável. Na feirinha de artesãos às portas da área, muitos produtos interessantes. Entre eles, uma pasta de castanha de caju que comprei direto das mãos do produtor que falava com tanta paixão de seu ofício e de seu amor pelo cajueiro. Essa experiência de conhecer essa planta e essas pessoas potiguares não cabe na mala ou na despensa, mas trago na alma cheia de saudades e gratidão.


Ameeeei o post e tô ansiosa pra provar essa receita natalina!
E também amei Carolina-cajuína, minha blogueirinha culinária favorita! ❤️❤️❤️
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